 |
|
 |
A quem a letra não urge? Considerando essa necessidade da escrita inerente a muitos, cá estão algumas letras que buscam cores como tratamento para dores diversas. |
|
 |
Blues
receite essa matéria para um amigo
Queria um pouco de chocolate... quente com café. Acabar com dores e colocar forças nas ansiedades.
Mas alérgica a chocolate, pegou uma goiabada na geladeira, doce de comer de colher, tinha endurecido, como seu coração, doÃdo. Sem doces, fechou a porta da geladeira sentida. Nada para adocicar sua vivência: como água, sem sabor, sem cor, sem cheiro.
Fechou a porta da cozinha. As paredes da sala, brancas-gelo, geladas. Queria um chocolate quente para aquecer toda essa ausência de tudo.
Mas ainda assim sentia medo enorme de casa vazia, só com ela. Não que acreditasse em fantasmas, mas o vazio da casa a fazia vislumbrar o seu próprio. Precisava sempre de uma busca, não importava o objeto, necessário sempre buscar algo, hoje era o chocolate, mas, como podia ser tão teimosa? Alérgica!!
Quem curaria sua ansiedade? Música, blues nascido de lá longe. Queria chocolate. Nada de azules.
Quando se sentia sozinha se sentia muito perdida. A ausência é causadora de todos os males, ela pensava. Estava ausente dos outros, fazia tempos que não freqüentava aquilo que se chama vida social. Sem freqüentar os outros obrigava-se a freqüentar a si mesma, mas como era muito chata, ficava mal humorada com tamanha companhia desagradável.
Um dia resolveu parar com a busca. Desligou para sempre o azul e colocou um samba, leve. Dançou até o crepúsculo e caiu, (cansada, feliz), na cama. Sozinha, mas sem divagações que a levassem a perguntar por tantas buscas, tantas ausências. Um samba apenas, para resolver os impasses. Compassada entre tantos tambores, dormiu pela primeira vez tranqüila.

(Ilustração: Carol Mattos)
-- Camilla Felicori gosta muito de cores. camilla.felicori@gmail.com
» leia/escreva comentários (8)
|