Paul McCartney – Up and Coming Tour


Nossa avaliação

Eu não vi Pelé jogar. Quer dizer, vi em imagens antigas. Mas nunca em um estádio, diante dos meus olhos. No basquete, acompanhei as partidas de Michael Jordan pela TV, mas também nunca pude ir a um jogo da NBA.

O que isso tem a ver com música? São poucas as oportunidades de testemunhar aquelas pessoas excepcionais que ajudaram a criar e transformar aquilo que hoje você ama.  E no dia 21 de novembro de 2010 eu tive a oportunidade de presenciar ao vivo um dos grandes do século XX.  Ver Paul McCartney em um palco é como ver Pelé em um gramado ou Jordan em uma quadra. É arte. É genialidade. É arrebatamento.

Estava ali, no estádio Morumbi, em São Paulo, um dos inventores da música pop. Estava ali o garoto que, quando resolveu formar uma banda de rock, foi os Beatles que ele criou. O homem que ao lado de John Lennon compôs algumas das músicas mais conhecidas da história. E estava ali o senhor que aos 68 anos consegue animar 64 mil pessoas por quase três horas ininterruptas.

De blazer azul, sorrindo e fazendo caras e bocas, Paul McCartney entrou no palco com o jeito simpaticão que iria mostrar durante todo o show da turnê “Up and Coming”. A música “Venus and Mars” deu início à festa e logo em seguida veio “Jet”. Paul falava em português, misturava um pouco de inglês e parece que todo mundo entendeu quando ele disse que teríamos uma grande festa naquela noite.

E então veio a primeira música dos Beatles, “All My Loving”. E o estádio explodiu. As pessoas gritavam, pulavam, algumas choravam enquanto imagens do quarteto de Liverpool apareciam no palco. “Letting Go”, “Drive My Car”, “Highway”. Paul tirou o blazer, brincou com os suspensórios de sua roupa, e falou mais um pouco de português. No piano cantou “The Long and Winding Road” e “Nineteen Hundred and Eighty-Five”.

O momento fofo da noite ficou por conta de “My Love”, que Paul apresentou dizendo em português: “eu escrevi esta música para a minha gatinha Linda, mas esta noite ela é para todos os namorados”. Já no violão, mais Beatles com a country “I’ve Just Seen a Face” e a balada a base de sacarose “And I Love Her”. “Blackbird” foi cantada sem a banda para acompanhar e, com o palco às escuras, dedicou “Here Today” a John Lennon.

E se Paul, de camisa branca, claramente se destacava do resto da banda vestida com roupas escuras, “Dance Tonight” foi a chance de alguma outra pessoa que não o ex-Beatle chamar a atenção da platéia: o baterista Laboriel fez coreografias engraçadas (com direito a uma “Macarena”) e ganhou o público, que se divertiu com sua performance de comediante.

“Eleanor Rigby” também levantou a multidão, mas o momento de maior emoção estava reservado para “Something”. Após dedicar a música a George Harrison, Paul iniciou a canção tocando um ukelele para, em seguida, bateria e guitarra explodirem no palco junto a imagens de George projetadas no telão.

“Band on The Run” foi outro grande momento, seguida pelas divertidas “Ob-La-Di, Ob-La-Da” e “Back in the U.S.S.R.” Apostando pesado no repertório dos Beatles, Paul entregava cada canção embalada em uma mistura de euforia, nostalgia e carisma. “Paperback Writer”, “A Day in the Life”, “Give Peace a Chance”.

E de volta ao piano para cantar “Let It Be”, Paul foi responsável por transformar o Morumbi em um céu mais estrelado do que o de São Paulo: isqueiros e celulares acesos transformaram um mar de gente em pontos luminosos dançando ao som do clássico da auto-ajuda pop. As luzes continuaram, só que agora no palco, em “Live And Let Die”, o momento mais pirotécnico do show, com chamas e fogos de artifício para todos os lados. E “Hey Jude” encerrou tudo.

Ou pelo menos era isso que Sir Paul queria nos fazer acreditar. Mas tirando alguns desavisados que realmente começaram a ir embora, ninguém saiu do lugar. E Mr. McCartney voltou com “Day Tripper”, “Lady Madonna” e “Get Back”. Se despediu de novo e mais uma vez todo mundo ficou quietinho.

Quando ele retornou sozinho e com um violão na mão, todos já sabiam o que esperar: “Yesterday” cantada pelo seu compositor, ao vivo, diante dos meus olhos, era algo que eu nunca imaginei que fosse escutar (e olha que essa não é nem de longe a minha música preferida dele).

E então aconteceu: enquanto Paul tocava, na minha mente passavam imagens. Não aquelas projetadas no telão, mas cenas da minha descoberta dos Beatles na pré-adolescência, os discos escutados, o “Anthology” nas noites da Globo, as biografias lidas, os filmes.

Paul McCartney estava ali. E se ele brincou que todos tinham que ir para casa dormir, e se tocou a espetacular “Helter Skelter” e encerrou a noite com “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, o que ficou foi a sensação de que um ciclo meu havia se completado.

O cantor emendou em “Sgt. Pepper’s” o verso final de “The End”, música que encerra o último álbum dos Beatles, “Abbey Road”. Depois de provocar uma retrospectiva da minha vida em minha mente, Paul me mandou para casa com os versos “And in the end, the love you take is equal to the love you make”. E daí que sua última imagem tenha sido o tombo visto pelo telão? Eu só queria poder dizer “obrigado”.

Mas não sei se ele iria entender.


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