Cão sem rumo
25.10.07
por Daniel Oliveira
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O passado
(El pasado, Argentina/Brasil, 2007)
Dir.: Hector Babenco
Elenco: Gael GarcÃa Bernal, AnalÃa Couceyro, Ana Celentano, Paulo Autran, Mimà Ardú, Marta Lubos
Princípio Ativo: a geração enxaqueca
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Para o tradutor Rimini, protagonista de “O passadoâ€, separar-se de Sofia, com quem esteve junto desde a infância, é como sair da casa dos pais. É se sentir livre pela primeira vez. Escapar das garras e expectativas de famÃlia e amigos. É poder fazer suas próprias escolhas e aprender a viver per se em um apartamento fuleiro, com um colchão sem estrado e só água na geladeira.
Só que ao contrário do que acontece com Ciro e Ariel, outros exemplos da mesma geração, esse descobrir o mundo não é acompanhado por um descobrir a si mesmo e por um necessário amadurecimento. Rimini não é construÃdo no filme – ele é desconstruÃdo em cada um de seus relacionamentos, desintegrando-se e desaparecendo neles. Com problema de memória, ele perde o emprego, numa derrocada que culminará na perda total de sua identidade.
Não por acaso um tradutor – alguém que simplesmente reproduz a fala de outros, sem uma própria - o personagem do livro de Alan Pauls parece observar a vida, sem se assumir protagonista de sua história. No filme de Babenco (Carandiru), Rimini se divide entre o terno-e-gravata e o vÃcio em cocaÃna, a ‘famÃlia’ e o ‘mundo’, sem nunca ser forte o bastante para se decidir entre os dois.
Um contido Gael GarcÃa Bernal, quase sem falar numa atuação ao mesmo tempo inerte e enigmática, encarna esse vazio de caráter que Rimini preenche de namorada em namorada, de um relacionamento para outro, sem jamais se definir individualmente. Essa inércia faz com que a protagonista da história, impulsionando os acontecimentos, seja Sofia. AnalÃa Couceyro luta de igual para igual com Gael, equilibrando sua personagem na tênue linha entre o carinho incondicional e a obsessão psicótica pelo ex-marido.
Babenco usa o contraste entre o clássico e a multiplicidade contemporânea da arquitetura do centro de Buenos Aires como metáfora para a crise de Rimini. E a edição ágil realiza com objetividade as inesperadas passagens de tempo. Mas se ele é mais apurado que um Beto Brant, seu filme não flui tão bem quanto os do diretor paulista. O cineasta portenho-brasileiro se perde junto com Rimini no último terço do longa – o que, junto com a apatia do personagem, gera uma queda significativa do ritmo e do interesse pela trama.
Sem simpatia por Rimini e com Sofia cada vez mais surtada, Babenco encontra uma saÃda na alegoria ao final, com o tradutor cercado por várias mulheres. Ela sintetiza bem o personagem, mas escorrega para uma perigosa generalização da figura feminina – dualidade representativa de um filme que começa com bons personagens, mas acaba não sabendo muito bem o que fazer com eles.
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