Minha vida sem mim
19.02.10
por Daniel Oliveira
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Um olhar do paraÃso
(The lovely bones, EUA/UK/Nova Zelândia, 2009)
Dir.: Peter Jackson
Elenco: Saoirse Ronan, Mark Wahlberg, Rachel Weisz, Stanley Tucci, Susan Sarandon, Rose McIver, Michael Imperioli, Reece Ritchie
Princípio Ativo: o visual de Jackson e os olhos de Saoirse
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“Um olhar do paraÃso†tem tudo o que 80% dos filmes nacionais não têm: uma edição bem pensada, um visual coerente, uma linha de chegada clara e definida. O filme tem um diretor. Que tem uma proposta. Isso faz do longa um exemplo de domÃnio de linguagem, ainda que não uma obra-prima.
Os problemas existem e vêm principalmente do roteiro, adaptado do livro “Uma vida interrompida†de Alice Sebold. Nele, Susie Salmon (Ronan) é assassinada pelo vizinho George Harvey (Tucci) e fica presa numa Terra-Média meio termo, observando a famÃlia sofrer sua perda. Ao transformar um conto de luto e amadurecimento-após-a-vida em um exercÃcio de gênero que varia entre o thriller e o “coming of age movieâ€, o filme inevitavelmente achata alguns personagens.
Quem mais sofre com isso são Jack e Abigail, pais de Susie. Mark Wahlberg e Rachel Weisz fazem seu melhor, mas não conseguem disfarçar que os dois repetem a mesma nota (no caso dele), ou não têm muita profundidade e tomam atitudes mal explicadas (no caso dela).
As escolhas de Peter Jackson são por um filme que não seja suicidamente triste. A sequência que mostra a casa – e a famÃlia – de propaganda de margarina se desfazendo em luto acaba sendo uma montagem upbeat conduzida pelo timing cômico (irregular) de Susan Sarandon. No extremo oposto do que Lee Daniels fez em “Preciosaâ€, o cineasta neozelandês quis fazer um feel good movie sobre o assassinato de uma garota.
E a prova de seu talento como diretor é que ele consegue (!), com a ajuda da atuação de Saoirse Ronan que, assim como Kate Winslet em “Almas gêmeasâ€, rouba o filme. É através de seus olhos que vemos um quase-paraÃso colorido, kitsch e nostalgicamente psicodélico – injustamente criticado, já que seria anacrônico (e pouco original) criar uma Pandora ou uma Terra-Média de efeitos para um universo literalmente imaginado por uma garota de 14 anos na década de 70.
É também por eles que vemos o luto na Terra. Jackson foca “Um olhar do paraÃso†na divisão de Susie entre os sonhos de uma juventude que ela não terá e a relutância em encarar a injustiça violenta de sua morte súbita. E além de tomar para si (e seu filme) essa aversão – ele não mostra o crime, detalhadamente descrito no livro – o cineasta diminui sensivelmente a participação e o sofrimento dos pais. O resultado é menos drama familiar que um olhar carinhoso e autêntico de um mundo adolescente interrompido.
O maior mérito do diretor, porém, é seu domÃnio do cinema. Ao emular um thriller policial em cenas de suspense hitchcockiano, ele brinca com as expectativas do público por punição e vingança. Mas a história não é sobre justiça – para Alice Sebold, ela cabe a Deus (ou a uma Força Superior, ou o-que-seja). É sobre a possibilidade de ser feliz após uma tragédia. E isso Jackson entendeu perfeitamente.
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Ah, esses olhos: depois de “Desejo e reparaçãoâ€, é a segunda vez que eles vão te contar uma história. Do jeito que eles viram.
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