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Simetria perfeita

Keane ao vivo em Belo Horizonte - Chevrolett Hall, 13/03/2009

por Daniel Oliveira

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O Keane me ganhou logo na primeira música. “Lovers are losing†é o meu refrão preferido do último CD, Perfect Simmetry, e depois dela, eles não precisavam de fazer muito mais para me conquistar. Mas em seguida veio “Everybody’s changing†e todo mundo começou a bombar e as coisas começaram a ficar orgasmicamente fora de controle.

Esse não era o plano.

Estou em inferno astral. Sério. Estive num acidente de carro há alguns dias. Poucas horas depois, percebi que tinha realmente perdido alguém de quem abri mão inadvertidamente, numa desilusão amorosa atrasada e sufocante. E vendi a primeira prestação da minha alma nesta semana, começando um curso no emprego, que me impede de fazer o que eu mais gosto na vida, que é escrever aqui.

Então, quando fui para o Chevrolet Hall na quinta-feira, estava cansado e desanimado, pensando que ia ser mais um show vazio em Belo Horizonte, um tanto vergonhoso e insosso. Daí o vocalista Tom Chaplin entrou no palco, gastando um português melhor que o meu e com uma roupa que tinha mais cara de Alex Kapranos, e tratou de provar que (como sempre) eu estava errado.

É meio difícil explicar aqui o que aconteceu no show. Com sua camisa listrada de preto e rosa, sua jaqueta dourada, uma acústica impecável (e vários quilos a menos), Chaplin & sua trupe conquistaram o público belorizontino. Confesso que nunca tinha ouvido “olê, olê, olê, olê...†para nenhuma banda gringa no Chevrolet Hall. Mas era isso que o público gritava entre as músicas: “olê, olê, olê, olé, Keanê, Keanêâ€. Tipo Mineirão.


A prova do olê olê (do youtube.com/soniciq)

Por isso mesmo, é também difícil dizer qual música foi o ponto alto da noite. Não há dúvida de que as canções do primeiro CD, Hopes & Fears, empolgavam mais – apesar de entender, não concordei que “This is the last time†bombe mais que a ótima “Better than thisâ€, do último álbum. Ou que a cópia de U2 “Leaving so soonâ€, do Under the iron sea, seja uma explosão de energia, enquanto a megaprodução ao vivo de “You haven’t told me anything†custou a levantar a galera.

Mas mesmo o claro desconhecimento de Perfect simmetry pela grande maioria do público foi absolutamente engolido pelo inusitado caso de amor iniciado no show entre BH e a banda inglesa. Disparando várias frases em português (“Batam palmasâ€, “Dancemâ€, “Esqueçam seus problemas e aproveitem a noiteâ€, “É muito bom estar em Belorizontcheâ€), Chaplin e sua simpatia contagiaram todo o ginásio - que não estava lotado, mas vibrou muito mais emocionalmente do que quando esteve.

Prova disso foi a belíssima performance de “Perfect simmetryâ€, canção-título do recente CD. Mesmo desconhecida, a música tem uma ponte tão empolgante, seguido de um coral apoteótico, que o público não teve escolha, a não ser se render ao Keane. A versão acústica de “Try again†também arrepiou os presentes, mas não mais que a vocalização de Chaplin em “Bedshapedâ€, respondida em uníssono no encerramento do show. Sem contar a ousadia de entregar uma versão de “Under pressure†melhor que a original do Queen, em que o ex-gordinho britânico não deixa dúvidas do seu impressionante alcance vocal. U2 wannabe o caralho.



Chaplin sob pressão (do youtube.com/ivanavillefort)

Claro que “Somewhere only we knowâ€, “Is it any wonderâ€, “Crystal ball†e “Spiralling†levaram o público ao delírio. E claro que o vocalista inglês não tirou sua jaqueta dourada - e suou bicas com o calor insuportável que tem feito em BH. Mas isso era previsível. Assim como foi previsível o choque dele à mais que calorosa recepção do público mineiro. “We’ve never been welcomed like this before in a place where we played for the first time. All we can say is that we’ll definitely come here again, belorizontche†foi tudo que ele conseguiu dizer.

E as pessoas replicavam batendo os pés no chão, fazendo o Chevrolet Hall tremer. Isso, sim, era imprevisível. Tudo que eu conseguia pensar era “get a roomâ€. E “que bonitoâ€. O público belorizontino colocou seu coração na mão do Keane e a banda soube responder à altura. E é meio isso que o som do grupo inglês é: esse sentimentalismo cafona e com uma alta carga de sacarose, que pode causar diabetes nos mais cínicos (e que leva Tom Chaplin a fazer gestinhos de Mariah Carey em algumas músicas, em momentos hilários de vergonha alheia. Marcos Mion adoraria...).

Mas era exatamente isso de que eu precisava. Essa explosão de sentimentos sem muitos filtros, que acaba se transformando em alegria, dança e num sorriso indisfarçável depois do show. O Keane ainda foi delicado o bastante para não tocar “Playing alongâ€, uma das minhas músicas favoritas do último álbum, mas um pouco triste demais para o tom da noite. Tom Chaplin está mais magro, mas por dentro ele continua um gordinho simpático.

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